Torto Arado

by Itamar Vieira Junior

Surgiu poucos dias depois do feriado de Finados, deitada em meio a flores murchas que já haviam perdido a frescura, mas ainda guardavam o perfume das coisas que mirram e diminuem em sua própria finitude.

As coisas não se resolveram de forma fácil, mas o tempo cuidou para que as emoções esmorecessem.

Mas não suportei muito tempo esse sentimento de traição, subverti, porque tudo o que estava sentindo era grandioso.

Queria, eu intuía, que continuássemos a bem-querer Bibiana, mesmo tendo ela quebrado a lealdade que regia o universo de nossa casa.

Mas não havia toda essa potência no desejo, era algo bom como asas frágeis se movendo em meu corpo. Agora eu era uma fruta amadurecida convidando os pássaros a me bicarem,

Não agradeceu, era um homem, por que deveria agradecer, foi o que se passou em minha cabeça, mas conseguia ver em seus olhos a satisfação de quem tinha feito um excelente negócio ao trazer uma mulher para sua tapera.

Depois que ele me deitou na cama, beijou meu pescoço e levantou minha roupa, não senti nada que justificasse meu temor. Era como cozinhar ou varrer o chão, ou seja, mais um trabalho. Só que esse eu ainda não tinha feito, desconhecia, mas agora sabia que, como mulher que vivia junto a um homem, tinha que fazer.

Procurando alguma estrela perdida que se apresentasse como uma velha conhecida, para dizer que não estava sozinha naquele quarto.

Fiquei atenta a tudo o que acontecia, sabia que nada retornaria. Olhei com certo encantamento o tempo caminhando, indomável como um cavalo bravio.

Os donos já não podiam ter mais escravos, por causa da lei, mas precisavam deles. Então, foi assim que passaram a chamar os escravos de trabalhadores e moradores.