More on this book
Community
Kindle Notes & Highlights
Tinha muita coisa pra dizer e as palavras que não se dizem ao morto queimam na boca para sempre.
Francisco era ajudante habitual. Cresceu sabendo que até a morte faz falta quando demora a vir.
Era tudo tão lindo que nem coube nos seus pequenos sonhos. Ela precisou aprender a sonhar mais.
Esse sonho morreu com sua mãe.
A Voz falava de saudade e ele pensava em Mariinha — mas sem tristeza, porque nem toda saudade é triste. Conseguia imaginar sua mãe junto com a família de mulheres que adivinhavam a morte como quem fala de uma viagem qualquer.
Via-se de tudo, porque esperança e desejo obram o impossível.
A sua solidão era para sempre. Não fazia parte. Não tinha uma, duas, três pessoas para quem pudesse apontar e dizer: “Eles sabem de toda a minha vida, eles estão comigo, eles me aceitam, são minha família”.
Mariinha levou tanto com ela. A sua ausência era dolorosa demais, mas só agora, quase um ano depois, sentado no sofá rasgado na casinha do cemitério, Samuel percebeu que aquela ferida era incurável.
A consciência da solidão doía mais que qualquer outra dor.
Lembrou-se de que só foi feliz enquanto viveu com a mãe ao lado.
Final, final mesmo, Samuel, é só quando eu baixar teu caixão na cova. Ainda dá tempo. — Tu sonha muito, Chico. — Foi a morte que me ensinou. O tempo de sonhar é em cima da terra.