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como qualquer louco, apenas chamava todos os outros de loucos, menos a mim mesmo.
ao avaliar o que é bom e necessário, não sigo o que as pessoas dizem e fazem, nem o progresso, mas meu coração.
se as mesmas questões sempre se repetem, é preciso lhes dar resposta.
Minha vida parou. Eu podia respirar, comer, beber, dormir, porque não podia ficar sem respirar, sem comer, sem beber, sem dormir; mas não existia vida, porque não existiam desejos cuja satisfação eu considerasse razoável. Se eu desejava algo, sabia de antemão que, satisfizesse ou não meu desejo, aquilo não daria em nada.
Parecia que eu tinha vivido e andado para lá e para cá, até chegar à beira de um abismo, e via com clareza que não havia nada na minha frente, a não ser a ruína.
A vida me dava enjoo — alguma força indeterminada me seduzia para que eu, de algum modo, me desvencilhasse da vida. Mas não se pode dizer que eu queria me matar.
Eu mesmo não sabia o que queria: tinha medo da vida, desejava me livrar dela e, no entanto, ainda esperava dela alguma coisa.
“Existe, em minha vida, algum sentido que não seria aniquilado pela morte que me aguarda de modo inevitável?”.
Dediquei todo o coração a compreender a sabedoria e o conhecimento e a conhecer a tolice e a loucura, e compreendi que tudo isso também é agitação do espírito.
Porque em muita sabedoria há muito sofrimento; e quem multiplica o conhecimento multiplica o desgosto.
essa força, seja lá o que for, me retirou de minha situação desesperada e guiou a razão de um modo em tudo diferente. Tal força me obrigava a voltar a atenção para o fato de que eu, como centenas de pessoas semelhantes a mim, não sou a humanidade toda, e que eu ainda não conheço a vida da humanidade.
Ficou claro que toda a humanidade tem algum conhecimento do sentido da vida, não reconhecido e desprezado por mim. Decorre daí que o saber racional não fornece o sentido da vida, ele a exclui; e o sentido atribuído à vida por milhões de pessoas, por toda a humanidade, se fundamenta em um saber falso e desprezado.
O saber racional, na pessoa dos sábios e cultos, nega o sentido da vida, enquanto a enorme massa de pessoas, a humanidade inteira, reconhece esse sentido num saber irracional. E esse saber irracional é a fé, a mesma que eu não podia aceitar. Esse Deus trino, essa criação em seis dias, os demônios e os anjos e tudo isso que não posso admitir, a menos que me transforme num louco.
Pelo saber racional, se concluía que a vida é o mal, e as pessoas sabem disso, e não viver depende só das pessoas, mas elas viveram e vivem, eu mesmo vivia, embora soubesse, já havia muito tempo, que a vida não tem sentido e é o mal. Pela fé, concluía-se que, para entender o sentido da vida, eu devia renunciar à razão, exatamente ela, necessária para o sentido.
a essência de qualquer fé consiste em que ela dá à vida um sentido que a morte não destrói.
a afirmação de que você está na mentira e eu na verdade são as palavras mais cruéis que uma pessoa pode dizer a outra
Sacerdotes de todas as várias confissões, os melhores representantes delas, não me disseram nada, senão que acreditam que eles estão na verdade e os outros, na ilusão, e que tudo que podem fazer é rezar pelos outros.
Será que não é possível — dizia eu — alcançar um entendimento superior que permita que, do alto, as diferenças desapareçam, assim como elas desaparecem para o crente verdadeiro?

