Uma Confissão
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Read between June 11 - June 17, 2022
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Assim, em minha temporada em Paris, a execução pública de uma pena de morte denunciou, para mim, a precariedade da minha superstição no progresso. Quando vi a cabeça separar-se do corpo e ouvi o barulho das duas partes batendo dentro de uma caixa, entendi — não com a razão, mas com todo o ser — que nenhuma teoria da racionalidade do que existe e do progresso é capaz de justificar aquela ação e que, mesmo que todas as pessoas do mundo, por força de quaisquer teorias, desde a criação do mundo, achem que isso é necessário, eu sei que não é necessário, sei que é ruim e que, portanto, ao avaliar o ...more
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Por mais que me digam: não somos capazes de entender o sentido da vida, não pense, viva — não consigo fazer isso, porque já fiz isso antes, por muito tempo. Agora, não consigo deixar de ver os dias e as noites, que correm e me levam para a morte. É só isso que vejo, porque só isso é a verdade. Todo o resto é mentira.
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“A família…”, eu dizia a mim mesmo; mas a família são a esposa e os filhos; eles também são gente. Encontram-se nas mesmas condições que eu: devem viver na mentira ou ver a horrível verdade. Para que eles vivem? Para que eu os amo, os educo, os protejo, cuido deles? Para o mesmo desespero que sinto ou para a estupidez! Como amo minha família, não posso esconder deles a verdade — cada passo rumo ao conhecimento os leva na direção dessa verdade. E a verdade é a morte.
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No domínio especulativo, eu dizia a mim mesmo: “Toda a humanidade vive e se desenvolve com base nos princípios espirituais, nos ideais que a guiam. Esses ideais se exprimem nas religiões, nas ciências, nas artes, nas formas de governo. Todos esses ideais se tornam cada vez mais elevados e a humanidade caminha rumo ao bem supremo. Eu sou parte da humanidade e, por isso, minha vocação consiste em promover a consciência e a realização dos ideais da humanidade”. E eu, no tempo de minha fraqueza mental, me contentava com isso; porém, tão logo a questão da vida se insurgiu com clareza dentro de mim, ...more
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No entanto, assim como no domínio dos saberes experimentais o homem que sinceramente se pergunta como deve viver não pode se contentar com a resposta “estude as infinitas complexidades da mudança das partículas infinitas no tempo e no espaço infinito e então você entenderá sua vida”, assim também um homem sincero não pode se contentar com a resposta “estude a vida de toda a humanidade, da qual não podemos conhecer nem o início nem o fim e da qual não conhecemos nem uma pequena parte, e então você entenderá sua vida”. E é também exatamente assim que ocorre nas semiciências experimentais, e ...more
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Preciso saber o sentido de minha vida, e o fato de minha vida ser uma partícula do infinito não só não lhe dá sentido como destrói qualquer possibilidade de sentido.
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O saber racional, na pessoa dos sábios e cultos, nega o sentido da vida, enquanto a enorme massa de pessoas, a humanidade inteira, reconhece esse sentido num saber irracional. E esse saber irracional é a fé, a mesma que eu não podia aceitar. Esse Deus trino, essa criação em seis dias, os demônios e os anjos e tudo isso que não posso admitir, a menos que me transforme num louco.