Depois dos arrebatadores Tudo é rio e Véspera, Carla Madeira retoma seu interesse profundo pelos conflitos humanos em A natureza da mordida. Com capa metalizada e pintura trilateral exclusivamente na 1ª edição do livro.
“O que você não tem mais que te entristece tanto?” É com esta pergunta que Biá, uma psicanalista aposentada, apaixonada por literatura, aborda a jovem jornalista Olívia pela primeira vez ao encontrá-la sentada à mesa de um sebo improvisado. A provocação inesperada, vinda de uma estranha, capaz de ouvir “como quem abraça", desencadeia uma sucessão de encontros, marcados pela intimidade crescente e que aos poucos revelam as histórias das duas mulheres. “Nossa amizade começou assim, enquanto nos afogávamos”, relata Olívia.
Com alternância entre as vozes, a força narrativa objetiva, descritiva e linear de Olívia contrapõe-se às anotações esparsas de Biá, cujos fragmentos de uma memória já falha e pouco confiável conduzem a um ponto de virada na trama que irá revelar ao leitor eventos que marcaram o passado de cada uma, evidenciando o paralelo entre as diferentes formas de abandono sofridas (e perpetradas) pelas duas amigas. Ao conhecer Olívia, o leitor é preparado para compreender Biá e, finalmente, refletir sobre a pergunta: o que faríamos em seu lugar?
Como nos outros romances da autora, as personagens parecem saltar do papel para colocar o leitor diante de questões universais, entre elas a incondicionalidade do amor, a força do desejo, a culpa e o esquecimento, a memória e sua dinâmica inescrutável com o perdão. É também um livro sobre amizade.
Com uma narrativa singular, potente e envolvente, Carla Madeira se reafirma em A natureza da mordida como um dos maiores nomes da literatura nacional contemporânea.
Carla Madeira nasceu em Belo Horizonte. Largou o curso de matemática e se formou em jornalismo e publicidade. Foi professora de redação publicitária na Universidade Federal de Minas Gerais e é diretora de criação da agência de comunicação Lápis Raro. Em 2014, lançou seu primeiro romance, “Tudo é rio”, um sucesso editorial, recebido com entusiasmo pelo público e pela crítica.
Comecei esse livro com a convicção de que não gostaria dele, isso até cerca de quarenta páginas. Não é o melhor da autora que li, mas é, de fato, o que mais gostei. É comum Carla Madeira escrever acerca do perdão, dos erros e das dores que nos envolvem e envolvem àqueles aos quais amamos, só que, aqui, a história é acerca daquilo que nos escapa, aquilo que nos é tirado por vezes sem explicação, que vai e nos leva junto sem sairmos do lugar.
Diferentemente de Tudo é rio, onde a violência é uma escolha cruel dos personagens, aqui ocorre o inverso, a violência ocorre, mas de forma mais branda, onde não há margem para aquele que a vivencia escapar dela, porque vem desavisada, de um dia para a noite, entre aqueles que vão embora deixando para trás a dúvida e a incompreensão. É assim que Olívia e Biá se esbarram; na dor de terem sido deixadas no escuro, criam um laço que se não cura, ameniza e abre possibilidades de compreensão para o que ocorreu a cada uma delas.
Contando a vida das duas personagens, cada qual narra a indiscutível crueldade do tempo, aquele que leva a memória e deixa a impossibilidade de reparar os atos cruéis que se comete pela vida. Mais que isso, é um livro sobre a chance de, se nos fosse dada nova oportunidade, o que melhor faríamos, o que desfaríamos, quem não deixaríamos e o que mudaríamos. É esse o plot que cerca a vida de Olívia e Biá, mas que pode ser sobre cada um de nós. No mais, "não deveria ser preciso agredir para dizer o quanto se foi agredido".
extremamente bem escrito e ainda mais impressionante ver no final as referências a outros livros que foram usadas para construir esse aqui. ler carla madeira sempre é uma experiência por si só, independente da trama.
porém, não consegui engolir a morte de rita e nem o motivo da partida de teo. achei forçado, confuso, catastrófico demais.
preferiria que os dois rompimentos/idas dos personagens fossem mesmo sem “motivos” porque a vida é mais isso mesmo, um monte de adeus sem explicação e ponto.
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é curioso como cada livro marca a gente em algum lugar específico. o mais curioso ainda é ver como esse livro me marcou em todos os meus espaços, todas as minhas lacunas. esse livro tem características que eu geralmente não gosto muito: muitas histórias mescladas, muitos personagens… e eu consegui me envolver com todos, até com os que apareceram menos. e antes da metade do livro, em uma das revelações mais potentes, eu me desmanchei de um jeito como nunca antes: não consegui chorar, eu quis apenas me isolar do mundo. aquele abandono, de uma certa forma, também era meu. aquela tragédia também era minha. aquela perda brusca também era minha. nunca serei capaz de descrever o que a Carla Madeira causa em mim - tanto que estou pensando em reler “tudo é rio”, o livro que me causou tanto espanto. foi com a abocanhada da vida em “a natureza da mordida” que cheguei perto de entender Carla. que escritora primorosa! que tecido! Biá, Olívia, Rita, dona Laura e até mesmo a Violenta Violeta caminharão comigo.
ler esse livro me deu a mesma sensação de quando você tá esperando um ônibus e senta um idoso do seu lado no ponto e desata a falar sem um le com cre e você fica "aham" e seu ônibus não chega nunca
Não é um livro tão fácil de ler como os outros dois mas não deixa de ser maravilhoso. É um livro muito mais de pensamentos e menos de história , cheio de frases lindas. É um encontro de duas mulheres de gerações diferentes, da amizade e cumplicidade que se desenvolve entre elas e das suas histórias que têm em comum a falta de um fim.
Livro que não largas madrugada adentro. Uma obra belíssima e desestabilizadora como é apanágio da Carla Madeira. Um livro que não me deixa, que me persegue.
Achei um tanto quanto entediante e continuei a ler por pura teimosia, por achar que o livro prometia algo incrível nas últimas páginas. E realmente prometia, o problema é que não estou cinica, descrente com a humanidade e amarga o suficiente para apreciar todo o potencial do início desse livro. E por isso acho ele não tão bom assim, porque um livro bom prende a atenção do leitor desde o início, um livro bom não é uma prova de resistência onde o leitor tem que insistir porque existe uma recompensa no fim da montanha. Valeu a pena? Sim, mas porque sou teimosa.
Tem algo na escrita da Carla Madeira que é muito gostoso de ler, fluí, é bonito, é uma narrativa que me engata pela forma. O que eu senti nessa leitura e também nos outros dois livros que eu li da autora é a falta no enredo. Os enredos não me intrigam, não me suscitam muito o interesse em conhecer mais da história. O que me coloca em uma situação difícil de entender se são livros que eu gosto ou não. É interessante poder trocar com outras pessoas sobre esse e os livros da autora pois são livros que normalmente muitos gostam e gostam muito. Eu me questionei bastante durante a leitura 'o que tem aqui que me incomoda, o que tem aqui que faz com que eu não ame essa narrativa'. E talvez não seja o que tem, mas o que para mim falta. E eu não sei dizer exatamente o que é, penso que pode ser a forma de construção das personagens e suas histórias, da relação entre sujeitos e a forma como são narradas. Tem algo que não ressoa comigo e tudo bem, porque a literatura não é unanimidade. Acho que a curiosidade de tentar encontrar aquilo que tantos encontraram me levaram para essas leituras e eu infelizmente não tive a mesma experiência.
A sensação de ler esse livro me lembrou A Vida Mentirosa dos Adultos, de Elena Ferrante, porque sempre que eu parava de ler, achava difícil de retormar, mas uma vez retomado, não conseguia parar de ler. É uma leitura densa, me remeteu à terapia mesmo, aquela coisa de é bom, mas é ruim, mas é bom. Porque causa incômodo e reflexão. Enfim, gostaria de dar uma nota melhor, gosto muito da autora e do seu estilo de escrita, que me lembra sempre o tanto que a língua portuguesa é maravilhosa. Mas alguns detalhes do enredo simplesmente não me convenceram: a morte de Rita, que achei totalmente gratuita e forçada, e a partida de Theo, que achei muito mal explicada, considerando que é a causa de 50% de todo o sofrimento do livro. Gostei demais foi do apêndice de citações de Biá com as referências de onde vieram. Que riqueza de pensamentos!
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“Compreendo porque é que senti mais dificuldade com a escrita deste livro do que com os restantes da autora: as brincadeiras com a memória e com a forma como esquecemos certas coisas são propositadas. Afinal, Biá está a ter dificuldade em recordar certos aspetos da sua vida e baralha outros tantos, enquanto Olívia tenta compreender se não seria melhor esquecer as coisas que lhe aconteceram.”
O começo é lento, é necessário resistir até por volta da página 70, quando o mistério começa a ser revelado, e Carla Madeira engata seu estilo tão sensível e arrebatador. Com trechos de grandes obras da literatura e a capacidade de traduzir sensações em palavras, este para mim é uma obra prima.
um livro muito bem escrito e muito poético, mas terrivelmente chato. achei a história sem pé nem cabeça… estou fadada a não gostar dos livros dessa querida
Um livro cujo início é lento e mais difícil de agarrar, se compararmos com Tudo é rio. Mas tornou-se um livro belo, com uma mensagem forte sobre a vida, sobre erros, perdão, sobre coisas que nos escapam, sobre encontros do destino que mudam vidas.
Eu fiquei perdidamente apaixonada por Tudo é rio, e muito feliz quando saiu outro volume dela. É muito difícil se equiparar ao primeiro amor, mas ainda é bem construído, bonito, profundo: nas primeiras vinte páginas eu sabia que ia gostar.
Assim como aconteceu em "Tudo é Rio", a história dos personagens me cativou e acabei devorando o livro em poucos dias. A Natureza da mordida é uma reflexão profunda sobre amizade, abandono, dor e sobre as inevitáveis mordidas que a vida nos dá. Recomendo muito!
"Algumas coisas que li não se contentaram com minha memória, caíram no meu sistema digestivo, e eu as incorporei como a um bom bife. A ponto de não saber mais se são minhas as palavras que digo ou se eu deveria viver entre aspas."
Comecei a ler esse ainda no primeiro semestre, mas no meio de tanta mudança na minha vida e de uma ressaca literária HORRÍVEL, ele ficou abandonado pela metade.
Quando peguei pra ler de novo, comecei do zero, e acho que não existiria momento melhor na minha vida pra experienciar essa leitura. Gosto de observar o avanço que eu tive com o hábito de ler, como ele deixou de ser performático (como em alguns momentos da minha vida) e passou a ser sobre sentimento e lazer mesmo. E lembrei muito da Pam Gonçalves falando que as leituras tem seu tempo certo, a gente não precisa forçar.
Carla Madeira nunca me decepcionou, pelo contrário, quanto mais dela conheço, mais gosto. Mas esse aqui tocou numa ferida muito pessoal. Esse sentimento de controle que buscamos, a necessidade de uma resposta, um porque. E, o mais importante, a relação mãe e filha em toda a sua complexidade.
Enfim, me marcou por completo. De ficar repetindo frases na cabeça e demorar uma semana para escrever aqui porque não sabia por em palavras o que me atravessou. Lindo.
Ao longo da nossa vida o que não nos faltará serão mordidas. Mais ou menos dolorosas, algumas deixarão cicatriz e poderão teimar em reabrir. Ainda que nem sempre sinta empatia com as personagens de Carla Madeira, mais cedo ou mais tarde, alguma dirá alguma coisa, alguma fará alguma coisa, em que me revejo. E nem sempre é pacífico. É aí que a história me ganha, porque pela qualidade da escrita já me ganhou na primeira página. Este livro traz um bonus que qualquer leitor vai adorar. Ainda no início veio o primeiro choque da boca de uma das personagens : " Cê vai, ocê fique, você nunca volte." Não me restaram dúvidas, esta afirmação marcou a minha primeira leitura de João Guimarães Rosa, A Terceira Margem do Rio, e foi responsável pela descoberta de um autor que virou favorito da vida. A partir daí, foi frequente encontrar frases, iguais ou com pequenas alterações, de livros que já li e identifiquei imediatamente. Muitas não reconheci, mas no final a aurora explica por que o fez, reproduz e identifica cada uma. Um mimo!😍