Algumas pessoas têm uma resposta para tudo. Tiram do chapéu teorias, ideias e grandes argumentações. Pode até funcionar de vez em quando, mas não contra ele. Ele também tem uma resposta para tudo. A mesma, em todas as ocasiões. E não se conhece ninguém que tenha resistido a ela. Políticos, artistas, socialites, modernetes, publicitários, colunistas de jornal e mauricinhos, todos eles tentaram, todos eles falharam. A resposta vinha de um buraco de esgoto: CUSP. Uma das criações máximas de Angeli, Bob Cuspe foi a grande resposta do cartunista aos excessos dos anos 1980, à hipocrisia reinante da elite cultural e financeira, à vida espalhafatosa e deslumbrada dos yuppies que vicejaram no Brasil após o fim da ditadura. Seu brinco era um grampo, suas roupas não passavam de trapos, a porta de sua casa era um bueiro e suas bandas eram os Ramones, os Ratos de Porão, os Sex Pistols e o The Clash. Seus inimigos estavam por toda parte. Assim como Rê Bordosa, Wood & Stock, Benevides Paixão e Mara Tara, Bob Cuspe fez história na revista Chiclete com Banana, grande marco do quadrinho independente brasileiro. Com tiragens que chegavam a mais de 100 mil exemplares mensais, a Chicletefoi um dos símbolos da redemocratização; se Rê Bordosa apontava mudanças nos costumes e na vida social do paulistano, Bob Cuspe serviu para encapsular a frustração, a raiva, os anseios e a revolta dos desfavorecidos. Todavia, quem espera encontrar aqui militância e proselitismo veio ao lugar errado. A resposta de Angeli está à altura da pergunta: ácida, cruel, sem concessões, uma cusparada na cara de tudo que está aí.
Arnaldo Angeli Filho, mais conhecido com Angeli, (São Paulo, 31 de agosto de 1956) é um dos mais conhecidos chargistas brasileiros. Começou a trabalhar aos catorze anos na revista Senhor, além de colaborar em fanzines. Em 1973 foi contratado pelo jornal Folha de São Paulo, onde continua até hoje. Desde os anos 80, Angeli vêm desenvolvendo uma galeria de personagens famosos por seu humor anárquico e urbano; entre eles se destacam o esquerdista anacrônico Meia Oito e Nanico, o seu parceiro homossexual enrustido (mas não muito); Rê Bordosa, conhecida como a junkie mais "porralouca" dos anos 1980; Luke e Tantra, as adolescentes que só pensam em perder a virgindade; Wood & Stock, dois velhos hippies que deixaram seus neurônios na década de 1960; os Skrotinhos, a versão underground dos Sobrinhos do Capitão; as Skrotinhas, a versão "xoxotinha" dos Skrotinhos; Mara Tara, a ninfomaníaca mais pervertida dos quadrinhos; Rhalah Rikota, o guru espiritual comedor de discípulas; Edi Campana, um voyeur e fetichista de plantão à procura do melhor ângulo feminino; o jornalista Benevides Paixão, correspondente de um jornal brasileiro no Paraguai e o único a ter conseguido entrevistar Rê Bordosa; Ritchi Pareide, o roqueiro do Leblão; Rampal, o paranormal; o machão machista Bibelô; o egocêntrico Walter Ego (também conhecido como "o mais Walter dos Walters"); Osgarmo, o sujeitinho vapt-vupt; Rigapov, o imbecil do Apocalipse; Hippo-Glós, o hipocondríaco (inspirado em Cacá Rosset); Vudu; Los Três Amigos e Bob Cuspe, o anárquico punk que cuspiu nas piores criaturas de nossas gerações. Ele próprio também se tornou um personagem, estrelando de início as tiras "Angeli em crise". Outra versão caricata sua é o personagem Angel Villa de Los Três Amigos.
Bob Cuspe é meu espírito animal. Como uma anarquista de quase meia idade o simbolismo das tirinhas de Bob Cuspe ainda reverberam profundamente em mim e ouso mencionar que ele continua atual em seu niilismo quanto à decrepitude do ser humano contemporâneo, por isso recomendo com uma veemência maior a edição do Bob Cuspe completo do que a da Rê Bordosa.
Nessa edição há uma seleção de músicas favoritas do Bob, a qual prontamente fiz uma playlist no Spotify: https://open.spotify.com/user/1215888... (infelizmente ficou faltando Vou Fazer Cocô dos Garotos Podres que por razões óbvias não estão no Spotify)
- Entre ficar à direita, atolado em ignorâncias e selvagerias econômicas... e à esquerda, entupido de moralismos e preconceitos idiotas... Prefiro ser da turma do fundão!
Andava na escola quando a revista Chiclete com Banana era publicada em Portugal. Boas tirinhas com muito humor, crítica, sátira e pentelho na boca. Tudo coisa normal de se encontrar na muita loucura da revista. Era fácil conseguir uma associação da identidade de alguns personagens com os colegas ou professores, políticos e situações do dia a dia nessa época.
Rê Bordosa, Bibelo, Mara Tara, Rhalah Rikota, eram dos que eu gostava mais. Walter Ego e Osgarmo eram o auge da estupidez, mas a revista tinha a sua magia muito por causa da mistura das várias e muito boas personagens.
Este é um apanhado das histórias de Bob Cuspe. Bom para matar saudades.
a principal criação de angeli, bob cuspe é um punk paulista que, ao final de cada tira, escarra em alguém. as próprias tiras são anarquistas e criticam o status quo, a podridão de sp e os pacatos cidadãos.
angeli, junto de laerte, mudou a cena de quadrinhos humorísticos do brasil: o coração da produção foi transferido do rj para sp. as tiras não seriam tão boas se bob cuspe e angeli não fossem paulistas; isso é essencial pro personagem.
Coletânea que traz todo o zeitgeist dos quadrinhos (que importavam) dos anos 80 no Brasil. Formador de caráter, ainda que ao ser revisitado revele uma inocência meio inesperada e toda a incipiência de quem estava tateando no escuro, mas fazendo algo importante.