Depois de Jornada de África, primeiro romance do autor, e a par de Alma e A Terceira Rosa, Prémio Literário Fernando Namora, a publicação das narrativas de O Homem do País Azul veio revelar uma outra consistente faceta da criação literária de Manuel Alegre. Nelas se conjuga o mais particular e o mais secreto de cada homem com a imensidão do fantástico e do arquetípico. E a dualidade, tratada com acentuada riqueza estilística, confere-lhes sentido universal. O sentido universal da errância e da procura, do real e do imaginário, das rotinas e do inesperado, que em qualquer momento tudo pode subverter. Na alegoria de O Homem do País Azul estão de facto abrangidas todas as terras onde se demanda a liberdade e o sentido de existir. Por ela perpassa o sonho e a nostalgia dos anos sessenta: Paris, Argel, Bolívia, Guevara, a utopia, a festa, o amor, o risco. O Homem do País Azul, poético, fantástico, misterioso, vai direito ao coração. E reacende a «memória perturbada».
MANUEL ALEGRE nasceu a 12 de Maio de 1936 em Águeda. Fez os estudos secundários no Porto, altura em que fundou, com José Augusto Seabra, o jornal Prelúdio. Do Liceu Alexandre Herculano, do Porto, passou a Coimbra, em cuja Universidade foi estudante de Direito, de par com uma grande actividade nas áreas da política, da cultura e do desporto. Destacado elemento dos movimentos estudantis, fez parte da Comissão da Academia que apoiou a candidatura de Humberto Delgado a presidente da República; foi um dos fundadores do Centro de Iniciação Teatral da Universidade de Coimbra (CITAC) e membro do Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra (TEUC), foi ainda director do jornal A Briosa, redactor da revista Vértice e colaborador da Via Latina; praticante de natação, representou a Académica em provas internacionais.
Em 1962, foi mobilizado para Angola, tendo aí participado numa tentativa de revolta militar, pelo que esteve preso no forte de São Paulo de Luanda, cárcere onde conheceu Luandino Vieira, António Jacinto e António Cardoso. Libertado da cadeia angolana, foi desmobilizado e enviado para Coimbra em regime de residência fixa. Em 1964, exilou-se para Argel, onde viveu dez anos. Ali seria dirigente da Frente Patriótica de Libertação Nacional (FPLN), presidida por Humberto Delgado, e principal responsável e locutor da emissora de combate à ditadura de Salazar, A Voz da Liberdade. Após o 25 de Abril, regressou a Portugal, passando a dedicar-se à política no seio do Partido Socialista de que é membro da Comissão Política. Foi Secretário de Estado da Comunicação Social e Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro para os Assuntos Políticos do I Governo Constitucional (1976-1978), deputado à Assembleia da República (1976-2009) e membro do Conselho de Estado, do Conselho das Ordens Nacionais e do Conselho Social da Universidade de Coimbra. Em 2006 foi candidato à Presidência da República, obtendo 20,7% dos votos, tendo-se recandidato em 2011, onde obteve 19,7% dos votos.
Foi o primeiro português a receber o diploma de membro honorário do Conselho da Europa. Entre outras condecorações, recebeu a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade (Portugal), a Comenda da Ordem de Isabel a Católica (Espanha) e a Medalha de Mérito do Conselho da Europa.
Como poeta, começa a destacar-se nas colectâneas Poemas Livres (1963-1965), publicadas em Coimbra de par com o «Cancioneiro Vértice». Mas o grande reconhecimento dos leitores e da crítica nasce com os seus dois volumes de poemas, Praça da Canção (1965) e O Canto e as Armas (1967), logo apreendidos pelas autoridades, mas com grande circulação nos meios intelectuais. Começando por tomar por base temática a resistência ao regime, o exílio, a guerra de África, logo a poesia de Manuel Alegre evoluiria num registo épico e lírico que bebe muito em Camões e numa escrita rítmica e melódica que pede ser recitada ou musicada. Daí ser tido como o poeta português mais musicado e cantado, e não só em Portugal, mas também, por exemplo, na Galiza (Grupo «Fuxan Os Ventos») e na Inglaterra (Tony Haynes, BBC). Daí Urbano Tavares Rodrigues: «Os dois grandes veios que alimentam a poesia de Manuel Alegre, o épico e o lírico, confluem numa irreprimível vocação órfica que dele faz o mais musical (e o mais cantável) dos poetas portugueses contemporâneos.»
Estreando-se na ficção com Jornada de África, em 1989, Manuel Alegre não deixa de arrastar para a prosa e pela prosa a sua vocação fundamental de poeta. «A poesia é a sua pátria», lembra Marie Claire Wromans, e confirma-o a prosa de A Terceira Rosa.
Para além das revistas e jornais já citados, Manuel Alegre tem colaboração dispersa por muitos outros jornais e revistas culturais, de que destacamos: A Poesia Útil (Coimbra, 1962), Seara Nova, o suplemento do Diário Popular «Letras e Artes», Cadernos de Literatura (Coimbra, 1978-), Jornal de Poetas e Trovadores (Lisboa, 1980-) e JL:
O primeiro livro que leio de Manuel Alegre. Imperdoável!
Este pequeno livro conseguiu realizar comigo dois grandes feitos: Recordar-me que há autores portugueses fantásticos e que merecem ser lidos. Nos últimos anos, após várias desilusões, fui tomada de uma grande descrença pelo que se escrevia em português; Reconciliar-me com livros de contos. Por norma não os leio porque me parece que as personagens e situações são superficiais. Tolice minha.
Neste livro, Manuel Alegre conta-nos dez pequenas histórias/momentos verdadeiramente maravilhosos e comoventes: O homem que faz revoluções; a mulher que abandona tudo na busca de si própria; as regras instituidas e a vontade de as subverter;... O meu preferido: A Pedra – “...a pedra que Albuquerque mandou colocar na Fortaleza de Malaca. Nela estavam os nomes dos que se tinham destacado na conquista da cidade. Mas como os portugueses não se entendessem sobre a ordem em deveriam ser gravados os nomes, Albuquerque ordenou que fosse colocada ao contrário, para que assim ficassem escondidos para sempre. E nas costas da pedra mandou gravar...”a lápide que os fundadores reprovaram”. ...somos sempre quem já nao somos. E todos os nomes estão escritos numa pedra virada para o esquecimento.” Muito profundo e tocante.
"El hombre del país azul" (Amigos portugueses, perdonadme por escribir en español; disfruto la lectura de vuestra bella lengua, pero no me atrevo a escribirla) es el héroe revolucionario que todos nosotros — los de la generación de Manuel Alegre y con preocupaciones por la justicia social — nos imaginábamos. Lo que él (el "homem" de este cuento) llama el "país azul" es cualquier lugar donde se vislumbra la posibilidad de realizar la revolución. Como el narrador del relato de este título, todos creíamos ver semejante figura en todas partes — ya sea en Montevideo, entre los Tupamaros; an Angola en el MPLA (especialmente relevante para los portugueses); en Argelia en el FLN de los años '50; en Indochina, Cuba, Sudáfrica, y finalmente (porque allí culminó y terminó este espejismo) en el "Che" Guevara muerto en Bolivia. La aparición de este "homem do país azul" en diferentes países, con diferentes nombres y hablando diferentes lenguas parece mágica en el relato, pero por otro lado es realista : así lo veíamos, así lo queríamos ver.
Entre los otros cuentos el tema de lucha revolucionaria, y más especialmente de la Resistencia a la dictadura de Salazar en Portugal, aparece repetidamente, especialmente en "A última noite" y "O outro lado", y marginalmente en "O aviso". Pero Manuel Alegre tiene otras saetas en su carcaj, y las dispara hacia las nubes de su fantasía. Como en "A pedra". Pero el cuento no político más delicioso es el último de esta colección, "Pessoa y Nenhum", donde "Pessoa" (que significa simultáneamente Fernando Pessoa y "persona") dialoga con "Nenhum" ("nadie", que también es un personaje de Fernando Pessoa). Ahí el autor reflexiona sobre su propia producción literaria, y especialmente la invención de personajes — como "o homem do país azul" — para hablar por él.
Confieso que antes de encontrar este libro (en un mercadillo de libros usados en Chiado en Lisboa) no tenía idea de quién era Manuel Alegre. Después de leer estas bellas e impactantes historias, lo he investigado y descubro que además de escritor, ha sido y sigue siendo un político muy relevante de la izquierda de este pequeño país (¿azul?) cuya cultura y lengua han repercutido a través del globo.
Gosto muito da prosa de Manuel Alegre. Pelo menos, foi esta a conclusão a que cheguei no fim das 138 páginas deste livrinho de contos, que comprei precisamente por causa do conto que dá o nome ao livro, lido no meu livro de Português do 10º ano e que me ficou sempre guardado na memória. Gosto de tudo. Dos toques políticos/históricos de O Homem do País Azul e O Outro Lado, aos toques fantásticos de Artur e os múltiplos de três e O Aviso, aos toques domésticos e intimistas de A Senhora do Retrato e A Grande Subversão, tudo me agradou sobejamente, e fez com que ficasse com ânsia de ler mais. Gosto principalmente da escrita simples e directa, sem grandes floreados ou rodeios, mas que consegue deixar um gostinho onírico na história.
Pequeno livrinho de contos reminiscentes sobretudo do período de exílio de Manuel Alegre, antes da revolução de 25 de Abril de 1974. Deixa a sensação de ter sido escrito mais para uso pessoal do escritor, como um livro de memórias imaginadas (polvilhado profusamente do "realismo mágico" que estava na moda na altura de edição do livro), do que propriamente um livro escrito para uma larga audiência. Lê-se facilmente mas também se esquece rapidamente.