que espanto!
eu estava lendo a revista traduzires, publicação da pós-graduação em tradução da universidade de brasília, e encontrei um artigo interessantíssimo de júnia barreto sobre os trabalhadores do mar, de victor hugo, na tradução de machado de assis. o artigo está aqui e conta o que a tradução de machado sofreu às mãos da editora abril a partir de 1970.
resumindo, o pessoal da abril pegou um capítulo do meio do livro e botou no fim. então ficou uma sandice. pois gilliat, o protagonista, se mata no final da história, que termina assim: "No momento em que o navio dissipava-se no horizonte, a cabeça desaparecia debaixo da água. Tudo acabou; só restava o mar".
mas, com esse disparate, o que acontece? está ele lá se suicidando e aí acorda com fome, vai atrás de comida, sobrevive - como fantasma, imagina-se - a uma tempestade, encontra o monstro marinho, bate num recife, passa por aquelas vicissitudes todas e termina o livro cantarolando bonny dundee! - fico até imaginando se não foi algum engraçadinho, meio entediado lá numa mesa da abril, que quis dar um toque de brás cubas a gilliat.
segundo a articulista, essa sandice perseverou por anos a fio, até 2000. a abril cultural se extinguiu em 1984-1985, mas fiz um rápido levantamento de suas edições d' os trabalhadores do mar desde 1970, e encontrei reedições em 1971, 1972, 1973, 1974, 1979, 1980, 1982 e 1983. como a distribuição da abril era voltada para bancas de jornal, suas tiragens eram altíssimas, de 70 mil exemplares para cima, e não raro com reimpressões no mesmo ano. quanto a outras edições entre 1984 e 2000 em outras editoras, não sei dizer.
na partilha de 1985, coube a richard civita o catálogo da extinta abril cultural, bem como o círculo do livro (empresa em sociedade entre a bertelsmann alemã), e assim encontramos uma edição d'os trabalhadores do mar pelo círculo em 1986. não sei como está. a partir de 1987, a nova cultural passa a publicar uma adaptação infantojuvenil feita por maria jacintha. não vi, não conheço, mas imagino que esteja correta, em vista de se tratar de ninguém menos que maria jacintha. a partir de 1993, a nova cultural volta a publicar o texto integral, mas não faço ideia se usou a edição da abril ou não: seguem-se reedições em 1994, 1999, 2002 e 2003. aí teria de ver; em todo caso, júnia barreto nos tranquiliza avisando que as edições de 2000 em diante estão normais.
de qualquer forma, se a abril cultural inaugurou sua sandice em 1970 e nela perseverou até seu encerramento, isso vai somar pelo menos nove edições até 1983, sem contar as reimpressões num mesmo ano. é só fazer as contas: mesmo feito por baixo, o cálculo dá um resultado assustador.
minhas saudações e parabéns a júnia barreto pelo belo artigo e pelo alerta fundamental.
Published on November 28, 2012 02:50
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