Igor Marcondes's Blog, page 2
April 11, 2020
Eu nego
Ah, se fosse tão fácil chegar ao centro
onde reside o equilíbrio, o ponto certo
no qual o bom e o mau se tornam um
o mesmo destino do que morre e nasce
de onde fugimos para tentar retornar
por curiosidade e, talvez, por coragem
aquele espaço racionalmente místico
paradoxal em sua indefinível origem
o lugar que está dentro de cada um
e, de tão próximo, parece inalcançável
desafio indissociável e peso necessário
por meio do qual cada um se reconhece
ainda que a negação se faça presente
afinal, ela também é parte do todo
April 10, 2020
Do tudo ao nada
Flores murchas nas mãos
raízes jogadas aos pés
vivendo entre irmãos
desgarrado das fés
nada mais pra amar
além do signo vazio
que ainda não é mar
e segue seu curso de rio
se desfaz na queda doce
de um sorriso aguado
que se lágrima fosse
nunca teria secado
um sentimento a mais
repousa triste no peito
decidir é deixar pra trás
o que poderia ter feito
e nesse ciclo tudo acaba
mesmo que demore
até do amor resta o nada
e o que é vida, morre
April 5, 2020
Retornarei
Dos instantes perdidos
retirei pensamentos frenéticos
o copo de água ficou cheio
e dentro dele a vontade de beber
a janela permaneceu fechada
e o ar novo lá fora
meu corpo quente na cama
e na minha boca um nome cerrado
que nada tenha seguido um rumo
é sinal de que faltou iniciativa
talvez explicada pelo medo do fracasso
residido em traumas mais profundos
e aqueles instantes que não aconteceram
se tornaram sonhos poéticos
magia que precisa de rituais novos
e sentimentos que requerem conceitos simples
disso tudo que vivi, me sobrou muito
um tesouro caótico que reluz e cega
tudo a depender da forma como se vê
se nos instantes perdidos fiz minhas dores
nos vividos as exaltei para me assegurar
pois a verdade pode usar máscaras
e é difícil reconhecer tantos atos
mas agora que me vejo neles, sei o que sou:
um caminho pelo qual passam instantes,
sentimentos e vontades; e vou sendo todos
conforme a velocidade de seu caminhar
com a única certeza de que passarão
April 2, 2020
Celular
Meu novo espelho
me permite falar
com quem mais importa
o reflexo digital
que quero expor
–
Criei a partir de mim uma versão
de tudo o que não sou
mas quero que vejam
na possibilidade
da não matéria
uma instituição mentirosa
que chamo de perfil
na qual morreu a realidade
em prol do que não existe
March 31, 2020
Olhos nos olhos
Da sua imagem nada retiro
exposta na vitrine do ego
abarca o nada em seu olhar
e dentro desse vazio
revela sua necessidade
a distância entre o significado
e o significante da sua expressão
pra quem quiser ver, ali se movem
em busca de uma falsa atenção
March 30, 2020
Pena
Eu não vou bater na sua porta
vou morder meus lábios
pra não dizer que tenho saudades
porque, em parte, seria mentira
uma desculpa pra voltar ao conforto
do desconfortável abraço seu
que não abraça, só se abre
solta por egoísmo
dizendo ser lição de independência
o que é pura megalomania
Não vou dizer que já mudei
pois há uma química forte em mim
vou cruzar os braços
pra não te estender as mãos
por pena do que você acha que é
e ainda não percebeu que não pode ser
Vou deixar em silêncio
tudo o que ainda quero dizer
já que alguns tons você não ouve
e algumas palavras você desconhece
tal qual ignora o amor e a empatia
March 25, 2020
Quando acabar
O fim terá chegado,
estará feito:
o que restar
é o que usaremos
pra reconstruir;
então, vejamos:
o que restará da moral?
o que restará da alegria?
o que restará do real?
o que nos restará da confiança?
o que nos restará da vida?
o que nos restará da esperança?
nos restará vontade?
nos restará amor?
nos restará dignidade?
talvez não restem lágrimas,
talvez não restem forças,
talvez não restem rimas.
March 23, 2020
Nada será como antes…
As notícias que me dão não são boas. Os amigos isolados, a família com medo, a vida limitada, a morte como horizonte. A incerteza está livre, caminhando pelas ruas. Ela nos saúda com malícia nos olhos e vontade nos lábios, porque sabe que se alimentará dos nossos sentimentos e, muitas vezes, da nossa carne.
O governo não existe e nos resta pouco do muito que pagamos. Há previsões espirituais, há motivações sentimentais e até situações racionais. E nada alcança a verdade, pois ela, mesmo no limite da vida, é velada por quem detém o poder sobre nós.
Em quem devemos confiar, o que acontecerá, de onde virá ajuda? A incerteza se fortalece, pois prova de nós o sabor da derrota diária, ainda que criemos redes de comunicação – uma fresta na máscara metafórica que nos sufoca.
O depois virá, e nada será como antes, certo? Não sabemos exatamente o que será diferente, mas algo deverá mudar. Em alguns de nós, a mudança virá da morte. Nada pode ser mais transformador… talvez o amor.
Nada será como antes amanhã e, depois de amanhã, novamente, tudo mudará, até que não percebamos mais o que está mudando. Então, parece que temos uma escolha: transformar conscientemente como amamos e nos expressamos, as coisas que queremos e nosso estilo de vida, pois se não houver mudança, restará uma certeza tão negativa quanto a incerteza que vivemos agora: a certeza de que não aprendemos nada.
March 22, 2020
O outro faltante
Aqui não tem ninguém
eu me falto
você se foi
eles não me conhecem
Aqui ninguém se vê
mas se expõe
sem saber
quem irá receber
Aqui não cabe a vida
só o que dela se deseja
o limitado pela sociedade
que no capital se apequena
March 17, 2020
Exploração
Ninguém me domina
além de mim
e ao me dominar
me deixo ser propriedade
da vontade alheia
de me dominar
Igor Marcondes's Blog
- Igor Marcondes's profile
- 4 followers

